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Mensagens

A mostrar mensagens de 2013

Luz

Cheguei sozinho. Os seguranças deixaram-me passar e deram-me um cartão colorido, sobre o qual nem perguntei o preço. Não estava ali para falar, muito menos com aquele idiota. O clube estava cheio mas todo aquele calor humano significava zero. Podiam ter olhado todos para mim que não iam ver nada. Afinal, sou invisível para o mundo. Pedi uma cerveja que nem chegou ao bengaleiro. Deixei o casaco e nem obrigado disse ao rapaz. As músicas foram passando ao som da vodka gelada. Mas nada me podia matar a sede e saciar realmente. Estava nervoso. Cravei uma pastilha a uma miúda engraçada que dançava sozinha ao meu lado. Tentou meter conversa mas um sinal de silêncio da minha parte foi suficiente para ela virar as costas. Isso, vai-te embora. És só mais uma, como todo o mundo, de costas para mim. Rapidamente a pastilha ficou sem sabor e eu precisava de mais. O último cigarro caiu-me ao chão quando entrei e até ele foi logo pisado por um imbecil qualquer. Na altura tive uma sensação de

Promoção daquelas que a gente gosta!

Não sabes que presente de Natal oferecer à namorada? Farto de gastar pinhas para acender a lareira? Garante já o teu exemplar de Baba & Camelo ou oferece-o a alguém como presente de Natal e poupa 18%! Promoção válida até dia 15 e limitada ao stock existente! Pede o teu livro deixando o teu email aqui nos comentários (o comentário não será publicado).

Plastificados

Desde cedo nos ensinam a passar as coisas a limpo. Parece haver um amor próprio em repeti-las, sem picos, sem altos e baixos, limpinhas limpinhas, como dizia o outro. A verdade é que nunca fui nessa conversa. O que os outros chamavam de rascunho eu chamava de versão final; e o que eles chamavam de versão final eu chamava de perda de tempo. À medida que fomos crescendo, o discurso foi mudando. As coisas passaram do papel para a vida real e a palavra também se alterou de “passar” para “tirar” a limpo. E mais uma vez, foi-nos dito e ensinado que as incidências desta vida têm de ser, pois então, tiradas a limpo, que os conflitos não são bem o que mostram ser, e que estávamos errados da primeira vez. Não querendo ser repetitivo, a verdade é que voltei a não ir nessa conversa. Não sei, pareceu-me uma má companhia e nunca lhe dei muita confiança. Nunca foi lá a casa e até atravesso a estrada para o outro lado quando vem na minha direção. Passar ou tirar as coisas a limpo reti

Pedidos

É costume torcer o nariz a quem não diz as palavras mágicas quando pede alguma coisa. Mas o que torcemos nós quando alguém nos pede, por favor, para irmos embora? É difícil imaginar algo mais tocante. Um pedido amavelmente disfarçado de ordem que vem sempre em má altura. É certo que temos de tirar o chapéu a quem tem a dignidade de ser bem educado e pedir por favor para nos ver pelas costas. Admito que seja um ato de benevolência e, simultaneamente, de coragem tentar ser delicado com quem nos incomoda naquele momento. E é um facto que as pessoas preferem levar um pontapé no rabo com umas pantufas em vez de umas botas de biqueira de aço. Ainda assim, cheira a paradoxo por todos os lados. E, pior do que isso, é o que fazem essas palavras. A pele que perfuram, os limites que ultrapassam. Ouvir um pedido desses, ainda para mais acompanhado de um “por favor”, é como ser atingido por uma daquelas “bombas sujas” usadas no terrorismo. É algo diminuto que nos atinge com uma precisão mi

Abrir a porta

Só há um lugar onde toda a gente é simpática para nós, mesmo sem nos conhecer de lado nenhum. Apenas existe um sítio onde novos e velhos nos presenteiam com graciosos gestos de bondade. Uma situação única seja na cidade ou na aldeia: o vaivém das portas públicas. Sim, estou precisamente a falar daquela situação em que passamos por uma porta mas não retiramos a mão, por simpatia e amabilidade à pessoa de trás, que nos retribui com um delicado “obrigado”. Esta simples ação, este aguardar por quem nunca se viu, este pequeno esforço ensina-nos muito. E nem damos por tal. Qual será o mistério? Que feitiço é este das passagens pelas portas que nos faz esquecer a pressa do século XXI e o frenesim do quotidiano? Bem sei que procuram neste blogue respostas para a vossa vida, mas a verdade é que não sei responder a esta. O que sei, e desde já vos passo a transmitir, é que todos podemos aproveitar esta situação! Se é um facto que as pessoas – sejam boas ou más – parecem derreter-se e

Para-lamas

Já uma vez escrevi que as pessoas deviam ter sensores de estacionamento como os carros . E desta vez volto à carga. Tal como eles passam na estrada com chuva e nos molham completamente, também as pessoas salpicam as outras com as ações que têm. E eu – quem mais – tenho uma solução. De facto, tal como os popós têm logo atrás dos pneus, também nós devíamos ter uns para-lamas que protegessem quem anda na sua vida e de vez em quando tem de levar com as nossas porcarias. Ninguém tem dúvidas que quando andamos de rastos lançamos lama aos sete ventos, que quando andamos à chuva fartamo-nos de meter e mandar água, que quando somos gélidos sopramos esse frio em todas as direções. Rolamos desenfreadamente sem pensar nos peões que por ali andam, nas crianças que vão atrás da bola, nos cães que correm atrás do carteiro. Os para-lamas iam evitar isso tudo. Não tinham de ser uns monos de borracha preta, atenção! Uma coisa gira, fashion, de uma qualquer marca da moda dos centros comercia

Chama-se viver

A nossa condição humana – podem-lhe chamar fraqueza – não nos permite descer de um ponto alto como os pássaros fazem. Podemos sonhar ser Ícaros num ponto alto de uma montanha, podemos ser loucos, como poucos o são, mas não somos borboletas prontas a voar. A nossa fraqueza, às vezes cozinha a ambição mais relevante. Ou seja, o homem nunca se dá por vencido! Aos grandes génios, aos grandes intelectuais que forçam a gravidade e experienciam, noutra dimensão qualquer, o sabor do vento a passar pelas suas melhores receitas e antídotos para a vida… fiquem com a saudade das borboletas. Voar sem asas é algo que o sonho nos transmite. Podemos estar vazios… podemos querer arrancar a vida das mãos de alguém mais audaz e tentar seguir os passos, mas a máquina de dentro, o coração… é quem magica e fornece a força necessária a ser forte. Ninguém sente por acaso. Ninguém se dá por acaso. Ninguém se põe à experiência por acaso. Testar os nossos limites é uma lição. E dizer que nos conhecemos

Se soubesse o que sei hoje

Passamos a vida a lamentar, a olhar para trás, a recuar virtualmente no tempo e a desejar ter feito isto e aquilo. Estamos sempre a chorar por não ter um comando como o da Zon para poder andar uns dias, semanas ou anos para trás. E tudo isto vem servido com uma boa dose da frase típica, qual lema da vida ingrata, slogan da amargura, espelho de todos os males: Se eu soubesse o que sei hoje… Raios e coriscos, quem nos acode que na altura éramos burrinhos e andávamos de olhos tapados com palas que nos impediam de ver e aprender o que sabemos hoje. Socorro, socorrinho, que não fomos capazes de olhar para a frente, de antecipar e de – falando futebolês – jogar no erro do adversário. E pronto, resta-nos fazer birra e olharmos para trás a desejar o que não tivemos, agarrados ao que não temos, enquanto não somos os únicos a olhar o céu. Sorte maldita a nossa, portugueses, amaldiçoados pela satânica saudade, que é viscosa e se cola às nossas mãos como a resina dos pinheiros. Cola e

Ser amor

Se há um elogio que está na moda é chamar alguém de amor. Ser um amor é fashion, aparece nas revistas cor de rosa e tem espaço de antena no Fama Show. Habituámo-nos a ouvir “és um amor!” quando fazemos as vontadinhas todas, oferecemos presentes ou simplesmente ouvimos um desabafo completo. Imagine-se que até aos animais de estimação dizemos que são uns amores. Esta miúda nova da novela é um amor, o senhor Jacinto do talho é outro amor e o bebé da vizinha é mais um. Tudo uns amores, portanto. Contudo, é sabido que eu sou uma pessoa esquisita nestas coisas e vejo pontas soltas na mais lisa das sedas. Dizer a alguém que essa pessoa é um amor pode ser giro e até ter o seu quê de carinhoso, mas a mim não me convence. O facto de ser “um amor” leva-me imediatamente a formular algumas questões: “um? Qual?” ou “porque não sou mais do que um?”. Ser um amor é ser uma parte de algo, um bocadinho, uma peça. E nada funciona em partes, aos bocadinhos ou às peças. Ser um amor é estar partido

Ciclone

Tal como um pão de ló se parte às fatias para dar para todos, também a vida se divide em ciclos, pelo mesmo motivo. Temos um bocadinho disto e logo depois seguimos para aquilo, rapidamente, para ver se não apanhamos grande fila. Os ciclos estão por todo o lado e não há como fugir deles. São janelas que se abrem pela fresca da manhã e se fecham à noite para os mosquitos não entrarem. Há ciclos que se repetem, como quando chumbamos no 5º ou 6º anos, e outros que só acontecem uma vez, como a passagem de Aimar pelo futebol português. Queiramos ou não, saltamos de ciclo em ciclo. O problema é que nem sempre podemos escolher em qual aterramos, e alguns fecham-se mesmo à nossa frente. Foi precisamente o que me aconteceu. Tenho a perfeita noção de que, há algumas semanas, fechou-se um ciclo no qual nunca entrei. Fiquei simplesmente a vê-lo rodar, naquela do “ver no que dá”. Talvez tenha gasto demasiado tempo a conferir o oxigénio antes de mergulhar e a verdade é que acabei por che

Baba & Camelo já à venda!

Está desvendado o segredo: é um menino! Baba & Camelo chega a este mundo para arrasar, prontinho a roer os chinelos lá de casa e morder aos estranhos! Um presente de aniversário perfeito para o avô! Uma verdadeira aliança para a namorada! Um souvenir marcante para o turista! Um carinho especial no dia da mãe! Esta é a tão aguardada salvação nacional que podem, a partir de hoje, adquirir para resolver os problemas da vossa vida: amarração, casamento, família, amor, negócios, vícios, doenças espirituais, inveja, mau-olhado ou impotência sexual. Podem obter o Baba & Camelo de duas maneiras: 1. através do site da editoraBubok  2. através da minha pessoa, com um preço de amigo. Basta comentar aqui no blogue, indicando um endereço de email (o comentário não será publicado) ou por mensagem no Facebook . Boas leituras de verão!

É dia de baba!

Baba & Camelo chega hoje vai passar tudo por aqui! Porquê Baba & Camelo? O nome do livro vem da sua configuração: está dividido em duas partes. A primeira (Baba) inclui soberbas obras de arte literárias, dignas de prémios internacionais, que deixarão o leitor precisamente de queixo caído, babando-se inevitavelmente. A segunda (Camelo) englobará pura verborreia, de qualidade a rasar a fossa, a chamada escrita de trazer por casa, que levará certamente o leitor a dedicar-me alguns dos mais tenebrosos insultos possíveis na Língua Portuguesa.  Além disto, este título vai permitir-me ainda atrair incautos curiosos, pensando eles tratar-se de uma coleção dos famosos cartoons de A Bola chamados ‘Barba e Cabelo’, bem como donas de casa enganadas por um suposto guia de receitas de doces conventuais com um nome muito semelhante. Baba & Camelo É para o menino e para a menina!

Despedidas

Estou revoltado. Não suporto mentiras e as despedidas são umas mentirosas de primeira ordem. Agora percebo porque há cada vez mais gente que não gosta delas e não é apenas uma moda. As despedidas mentem-nos descaradamente e voltam a fazê-lo na próxima vez. São como as máquinas multibanco: parece que nos estão a dar algo, mas na verdade tiram-nos o que temos de mais valioso. Sossegam-nos momentaneamente para que não pensemos no que virá a seguir. Pior. As despedidas são viciantes. Drogam-nos com o carinho de um beijo, traem-nos com o calor de um abraço. E o que temos no dia seguinte? Uma tremenda ressaca, como se tivéssemos bebido todo o Martini Bianco deste mundo. Bebemos e despedimo-nos socialmente. Um fino à tarde com os amigos, um até logo à noite. Uma saída até amanhecer, um até amanhã à tarde. O problema – como tudo na vida – é quando abusamos. Os copos e as despedidas não deviam ser muito mais do que isto… mas são sempre. É mais forte do que nós. Divertimo-nos, dança

Malas à Portas

Não é de todo comum escrevinhar aqui sobre política, mas os acontecimentos dos últimos dias assim o ditam. Ora, caríssimos, sabeis todos que estamos em Portugal, onde tudo é possível, do bom ao mais inóspito. O momento é grave e, de repente, a novela da morte de Mandela foi substituída pela novela da morte do governo. Todos opinam mas nenhum arrisca um palpite sobre o melhor cenário, talvez porque não se vislumbra nenhum. O mal-amado Coelho parece respirar cada vez com maior dificuldade, devido à gravata que lhe aperta o pescoço, em forma de CDS. Tudo começou quando Gaspar, quiçá orientado por uma estrela, decidiu pegar nas suas coisinhas e procurar outro norte. A ele seguiram-se mais reis magos, procurando a saída pela porta das traseiras, sem deixarem ouro nem incenso, enquanto a economia do país continua a mirrar. Portas tirou o tapete à coligação, onde agora quaisquer passos parecem utópicos. De facto, o apelido “Portas” poderá ter um paralelo naquelas portarias dos típi

A chegar

Está escolhido o substituto de Paulo Portas na pasta dos Negócios Estrangeiros. O jovem BABA & CAMELO toma posse dentro de alguns dias. Tão breve, brevemente!

Falar com pedras

Às vezes penso que estou a falar com pedras. Sim, pedras. O meu caro leitor já experimentou dialogar calmamente com um calhau rochoso? Pois é exatamente isso que eu sinto. E não estou a falar do cão que me ignora e rói os chinelos na mesma ou daquele amigo que foi ao balcão e não trouxe a mini que pedi. Refiro-me antes às pessoas que, por mais direta que seja a mensagem, não conseguem percebê-la. Iniciado o habitual e tão português processo de atribuição de culpas, vamos aos factos: eu não tenho problemas com a Língua Portuguesa e o sotaque viseense parece estar no mínimo. Não sou gago, não falo para dentro ou entre os dentes, nem baixinho ou demasiado alto. Enfim, sou uma pessoa normal e, por isso, a culpa tem de estar no cartório do lado de lá. Eu bem tento, esforço-me por retirar tudo o que é acessório da conversa e dou ênfase ao que é importante. Tento não distrair em vez de informar mas, por vezes, a outra pessoa parece não estar lá! E quando está, pega em todas as pontin

Os dinossauros

Aqui o felizardo vai ter oportunidade de assistir ao regresso do Parque Jurássico aos cinemas, ou não fosse eu um fanático dos extintos bichos. Mas estarão assim tão extintos? Bem, não se pode dizer que uma coisa está pouco ou muito extinta, da mesma maneira que não entendo quando alguém diz que “o homem era muito honesto”. O que é alguém pouco honesto? Mas não nos desviemos. Estava a falar de dinossauros, aqueles monstros que em tempos povoaram aqui o burgo. Na verdade, toda a gente sabe que eles continuam cá, embora tenham assumido outras formas. Políticos, músicos ou atletas são alguns exemplos.  E dentro dos portugueses há destaque para alguns. Por exemplo, o meu querido José Cid assemelha-se bastante a um tiranossauro quando está sentado ao piano, com as suas patinhas da frente sobre o teclado. Eis a prova de que os dinossauros estão bem vivos. De facto, há uns três ou quatros anos até me cruzei com um numa solarenga praia algarvia. A sua pele escamosa era reconhecida ao

5 anos de Digo-te, agora em livro!

Tenho todo o prazer do mundo em apresentar o meu mais novo! É um rapaz e vem ao mundo dentro de poucos dias. Chama-se BABA & CAMELO e é bem mais do que um livro! É um livro e peras, que celebra o aniversário do Digo-te (faz hoje 5 aninhos!) e reúne os maiores clássicos literários do blogue, trazendo ainda uns extras todos fashion! Com prefácios da pequena mas grandiloquente Marta João e do súcio mas excelso Renato de Leão, e uma entrevista aqui ao autor conduzida pela perigosa mas eminente Carolina Leitão, BABA & CAMELO é bibliografia obrigatória do desenvolvimento pessoal! Tão breve, brevemente disponível! www.Digo-te.blogspot.pt 5 anos na boa-vai-ela.

A brincar, a brincar

É do conhecimento do magnificente leitor que aqui o je não vai à bola com provérbios e expressões. Mas, qual Carlos Cruz, também eu me vou entregar. Não porque andei a jogar à macaca com quem não devia, atenção, mas apenas porque há uma expressão digna da minha inesgotável mas preciosa simpatia. Das duas uma: ou o sumptuoso leitor é adivinho ou simplesmente leu o título. “A brincar a brincar” é das mais belas pérolas da língua cá do burgo e eu confesso que só não a uso ao pescoço presa num fio de coco porque está a chegar o calor e quero bronzear a minha zona peitoral. A inocência de um simples “a brincar a brincar” é tanta que esta expressão pode ser usada em qualquer circunstância. Desde um funeral: “A brincar a brincar foi contra um camião” Passando por uma conferência de imprensa: “A brincar a brincar podíamos ter perdido o jogo” Até dentro de outra expressão: “A brincar a brincar se dizem as verdades” Experimente, faustoso leitor, dispor de tal v

Entrelinhas

Tenho para mim que os cientistas deste mundo andam a dormir. É a única explicação sensata para o facto de nunca se terem debruçado sobre um dos maiores mistérios deste planeta: as entrelinhas. Quem me conhece já ouviu da minha adorável boca que eu nunca falo nas entrelinhas e que, por isso, escusam de tentar encontrar outro significado naquilo que digo. E se não o faço é apenas pela simples razão de não entender este fenómeno. Afinal, o que cabe nas famosas entrelinhas? A primeira coisa que me vem à cabeça são os tempos da escola primária, em que havia uns cadernos de linhas muito próximas umas das outras, e aí sim, o objetivo era escrever entre elas. Mas, até nesta perspetiva, as entrelinhas deixavam a desejar. A letra desajeitada era demasiado grande para se encaixar naqueles riscos paralelos e, na maioria das vezes, saltava fora, fazendo saltar igualmente a tampa à minha professora. Confesso, pois, que as entrelinhas me dão medo, porque parecem ser um buraco sem fundo!

Linhas paralelas

Quando nos sentámos os dois naquele banco de jardim e deixámos os outros continuar caminho, tenho de admitir que não te estava a prestar atenção. Choravas e dizias o que te corria mal na vida, enquanto me davas a mão, procurando talvez algum conforto. Mas não era isso que eu estava a ouvir. A água que te escorria pelas duas faces batia-se arduamente para ultrapassar o relevo dos teus lábios. Ainda assim, eu não fixava sequer nenhuma dessas lágrimas. O que via? Bem… Sei apenas que os meus olhos penetravam intensamente nos teus e, de repente, a noite quase dava lugar ao dia. Continuavas com as tuas histórias, as mil e uma aventuras do teu coração destroçado, varrido – nas tuas palavras – por um furacão que deixou a mais profunda das mossas. Acho que tentavas partilhar a agonia com alguém como eu, que mal conhecias, e que não tinha dados suficientes para te julgar. Mas a verdade é que eu não equacionei, por um segundo que fosse, ajudar-te nessa escalada rumo à serenidade.  A min

Luís Simões - um homem de L a S mas que por vezes veste XL (parte IX)

No final do primeiro mês de Erasmus em Salamanca, a minha pessoa já se tinha inteirado da realidade espanhola. Sabia qual o supermercado mais barato, que toda a gente em Salamanca é do Real Madrid, que os espanhóis são viciados na lotaria, que as lojas fecham durante a sesta e que a noite de Salamanca é tudo aquilo e mais alguma coisa do que se diz. Dizem que a primeira vez fica na memória para sempre. Meus amigos, é a mais pura das verdades. E a minha foi com duas meninas. A primeira vez que saí, entenda-se, que este é um blogue sério e não há cá espaço para essas poucas vergonhas. Essas duas pessoas, as tais que também vieram de Coimbra, rapidamente se tornaram num apoio fundamental para a minha estadia em Espanha. E assim permaneceram até ao final, ganhando um passaporte de amizade, que só peca por não ter sido passado mais cedo. Mas estava eu a falar da noite. Admito que os espanhóis gostam de festa e Salamanca dá-lhes todas as condições para isso. É uma cidade r

Luís Simões - um homem de L a S, mas que por vezes veste XL (parte VIII)

Eu espanho, tu espanhas, ele espanha Quem me conhece, para além de poder sentir-se um privilegiado, sabe que já fui um ser mais tímido do que agora. Onde terei então perdido essa timidez que me fazia corar as bochechas só de ver uma pessoa que não os meus pais? Bom, basicamente fiz com a timidez o que as pessoas distraídas fazem com a carteira: fui perdendo aqui e ali, aos poucos e de maneiras incríveis. E a mais incrível de todas pode muito bem ter sido esta: Erasmus em Salamanca. Começou tudo com uma ideia que englobava uns dois ou três amigos num país distante, a vivenciar uma das maiores experiências das suas vidas. Mas rapidamente dos dois ou três amigos fiquei só eu e o país distante foi-se aproximando até passar a ser este mesmo, aqui ao lado. Sondei a coisa lá em casa e o “sim” parecia não querer sair, como aquele chocolate que fica encravado na máquina e não cai. Nada que uns abanões não resolvam. O argumento de que Lisboa ficava mais longe do que Salamanca resultou

Alentejo, Terra Santa

A NASA admitiu há uns tempos que a vida na Terra pode ter começado no Alentejo. Não duvido nem por um segundo que um organismo unicelular tenha escolhido Cabeço de Vide   para despontar para o mundo. A minha dúvida é outra: pode Portugal gerar agora um novo tipo de vida? É disso que todos precisamos, dizem os jornais. De uma vida nova! De renascer das cinzas! Ora se as leis da física foram quebradas há milhões de anos neste jardim à beira-mar plantado, porque não pode aparecer novamente em terras lusitanas uma moderna fonte de vida? Daquelas iluminadas com jatos coordenados entre si como há nas rotundas? Tenho pensado no assunto nas poucas horas que dedico ao ócio e, entre uma ou outra bolacha maria, lá vou desenhando uma nova vida à qual poderíamos facilmente dar um nome histórico. Pensai comigo: vida AT, vida ET, vida DT. Vida AT era a que havia Antes da Troika. Ainda se lembram? Ah como era bom este país... O dinheiro público saltitava entre a Expo98 e o Euro2004, o p

Bem-me-cai, mal-me-cai

Não sei o que caiu melhor por estes dias: aquele meteorito na Rússia ou um moscatel duplo com duas pedras de gelo. “Não bebas água por cima do leite que te cai mal” ou “aquela última cerveja de ontem não me caiu bem” são expressões muito comuns por este país fora. E até há outras, agora muito na moda, que roçam o brejeiro: “o que caía bem agora era o Passos Coelho de uma ponte”. De facto, toda a gente arrisca o seu palpite sobre o que caía bem ou mal neste país. Pode dizer-se, em jeito de trocadilho barato, que todos temos queda para a coisa. O governo, por exemplo, pensa que o que caía bem eram as despesas do Estado, mas afinal o que cai – e bem – são as receitas. Já o comum Zé Povinho queixa-se de que os impostos caem mal, quando na verdade queria que estes caíssem, e bem, a pique. No setor económico, e numa altura em que os mercados são tão falados, também as bolsas sofrem com esta expressão. A única coisa que cai bem aos acionistas é quando as suas ações não sofrem qu

Nem bom vento

Caríssimos, escrevo esta missiva num clima de grave crise. Ou numa crise de grave clima. Pensado bem é mais assim, que esta tempestade lá fora vira tudo ao contrário! Fosse José Castelo Branco apanhado por este vento suão e, não tenho dúvidas, estaria ali um novo Quim Barreiros, expoente máximo da virilidade em Portugal! Recordo com saudade os tempos em que vivia num “jardim à beira-mar plantado”, onde uns bons 35 graus eram capazes de assar uma sardinha no capot do Fiesta parado há nove anos no barracão da lenha. Tempos em que só havia duas estações do ano: verão e natal. E sucediam-se consecutivamente uma à outra, sem atropelos. O único casaco que tinha era estreado na noite de consoada e arrumado a meio de janeiro, tal era o calor que justificava, um mês depois, a reduzida indumentária das meninas do samba. O que aconteceu? O barulho do festival de vento e chuva lá fora é inacreditável! E o pior é que não me posso queixar à polícia desta má vizinhança! Nem riscar-lhes o ca

À segunda

Já toda a gente disse, já todos os jornais trouxeram, já todos os portugueses perceberam. Portugal não é, neste momento, um país de muitas oportunidades. Mas, como nas pilhas, há sempre um lado positivo: é um país onde abundam as segundas oportunidades! Não perceberam? Vou tentar explicar-me melhor – e cá está, um fabuloso exemplo de uma segunda oportunidade, neste caso para perceberem o que quero dizer! Peço-vos que também vocês me deem uma segunda oportunidade e não mudem já de página. As segundas oportunidades transformam-se, na maior parte das vezes, na oportunidade principal, seja porque correu mal na primeira vez, porque tivemos azar, porque a sangria estava demasiado boa ou, como se diz de há uns anos para cá, estávamos emocionalmente esgotados. Em Portugal, são inúmeros os exemplos de novas oportunidades pedidas ou concedidas, oferecidas ou consentidas, garantidas ou outras palavras acabadas em “idas” que agora não me vêm à cabeça. Na escola, há uma segunda fa