Cheguei sozinho. Os seguranças deixaram-me passar e deram-me
um cartão colorido, sobre o qual nem perguntei o preço. Não estava ali para
falar, muito menos com aquele idiota. O clube estava cheio mas todo aquele
calor humano significava zero. Podiam ter olhado todos para mim que não iam ver
nada. Afinal, sou invisível para o mundo.
Pedi uma cerveja que nem chegou ao bengaleiro. Deixei o casaco
e nem obrigado disse ao rapaz. As músicas foram passando ao som da vodka
gelada. Mas nada me podia matar a sede e saciar realmente. Estava nervoso.
Cravei uma pastilha a uma miúda engraçada que dançava sozinha ao meu lado.
Tentou meter conversa mas um sinal de silêncio da minha parte foi suficiente
para ela virar as costas. Isso, vai-te embora. És só mais uma, como todo o
mundo, de costas para mim.
Rapidamente a pastilha ficou sem sabor e eu precisava de
mais. O último cigarro caiu-me ao chão quando entrei e até ele foi logo pisado
por um imbecil qualquer. Na altura tive uma sensação de alívio. O meu cigarro,
o meu destino. Não somos mais do que cigarros. Não somos mesmo mais do que
eles.
Comprei uma água – perante o olhar estranho do outro lado do
balcão – e juntei-me a uma coluna. Dois ou três pares de olhos duvidaram das
minhas intenções ao aproximar-me das longas pernas dançantes. Mas não tinham de
ter medo. Aliás, ninguém tem medo de mim. Nem eu deles. O medo fica no meio, no
enorme espaço que me separa dos outros. Só podia contar com aquilo que ia tirar
do bolso. Meti à boca, dois ou três golos de água e esperei. Em poucos minutos
o tal espaço mingou. Senti tudo mais perto e ouvi a música mais alta. Pela
primeira vez em muitos dias o meu coração bateu. Passou-me de tudo um pouco
pela cabeça. A minha infância, a minha família, os meus amigos e os mais do que
amigos.
Porque raio não é sempre assim? Porque não posso voar por
cima do que não quero atravessar? “Porque não, porque não!” Espera! Quem falou?
Será a miúda da pastilha? Tenho a certeza que nunca mais me quer ver à frente!
Quem perde é ela! Eu nunca perco nada, só tenho a ganhar! Olha toda a gente
feliz à minha volta! Eu avisei! De onde apareceu este gin? Eu nem gosto disto!
Ei! Eu conheço esta música! Quem são vocês? Vou pois! É aqui? Vives sozinha?
Deixa-me.
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