Avançar para o conteúdo principal

Desalinhado

Aos primeiros raios de sol já eu lavava os dentes. Olhava para minha cara afogada em sono, sempre a mesma coisa. Uma vista de olhos às horas, um último exercício de memória para ver o que me falta. Sendo que do que me falta vou eu em busca.

Começo a despertar. Já há pessoas na rua, compram o jornal, tomam o café da manhã, seguem para as aulas, regressam a casa depois de uma noite intensa. Entro no metro que pareceu esperar por mim. Vejo as horas novamente: 10 minutos para o comboio. Tempo de mandar um bom dia para o outro lado.

Na estação, de olhos no ecrã como se fosse uma janela para um oásis qualquer, vejo o número da linha. Entro e procuro o lugar que me vai levar ao meu lugar. Ouço aquela voz eletrónica a anunciar cada paragem, cada ponto que nos separa, cada barreira. São muitas sim, mas sei que não me podem parar porque também ouvi o destino: tu.

Tento fechar os olhos para ver se engano a mente, para ver se tudo passa mais rápido, mas vejo-te em todo o lado, seja no escuro fabricado pelas pálpebras caídas, seja na claridade do sol a bater no vidro. Ainda estou tão longe e já te sinto perto. Já te cheiro, já te toco.

Conto os pássaros em bando no céu, releio as mensagens de ontem à noite, imagino-te a fazer o mesmo ao acordar. Olho para as minhas mãos e penso como estão incompletas. Imagino as tuas e reparo que se encaixam nas minhas como legos. Peça a peça, antecipo o que vou sentir quando te vir ao longe, o que vou fazer quando estiver perto de ti, o que te vou dizer ao ouvido quando nos colarmos.

Está quase. Já reconheço as ruas pelas quais passeámos e o mar que lemos juntos ao final do dia. “Estou tão perto”. Não respondes porque deves vir a conduzir. A mesma voz da partida anuncia a chegada, o comboio para e eu já estou junto à porta.

Saio. 

E é quando te procuro-te intensamente que me vibras no bolso. Estarás presa no trânsito? Estremeço ao ler as tuas primeiras palavras do dia. Deixo a mala e sento-me no banco mais próximo. Leio outra vez e tento ligar-te mas está desligado. Estás desligada. Cortaste a corrente e tudo se apagou. Não estás, não vens, não queres. Repito este trio uma e outra vez, a cada lágrima que se forma e evapora.

Só me resta ganhar coragem para fixar o ecrã das partidas, desta vez transformado em janela para a desilusão.

Comentários

Anónimo disse…
muito bem escrito, mas muito triste. nao sei se gosto. :( beijos

bjs
Joana

Os mais vistos do momento

Clave de sol

Um círculo vermelho. E tu no meio. É assim, tão simétrica, a nossa existência. Não fosse o rock’n’roll assolar-me os ouvidos, não fossem os velhos e bons Stones ditarem o ritmo, e era nas tuas curvas que leria a pauta. Autêntica clave, mais forte do que o sol, com mais classe do que a lua. Se nas veias o sangue corre sempre em frente, na cabeça o pensamento diverge sobre todos os caminhos a tomar para chegar a ti. Somos o mapa de nós mesmos, já criámos até um caminho novo, que ninguém tinha previsto e que ninguém percorrera antes. Sem indicações, lá seguimos viagem, cientes de que 2+2 só são quatro se quisermos. Liberdade completa, foi também para isto que Abril nasceu. Existimos em todas as línguas, somos vistos em todos os gestos. Não é preciso explicar a ninguém, porque ninguém ia entender. E, no entanto, entendem-nos desde o princípio. Não fomos feitos um para o outro. Não somos o testo da panela, não encaixamos como Legos, nem temos penteados à Playmobil. Mas a forma como enco...
... É incrível o poder desta cidade. Poder vir para cá o mais devastado possível. Poder sentir-se a pior pessoa do mundo. Até poder sê-la. Mas mudar tudo quando se chega aqui. Coimbra é quase como a ilha da série Lost, que tudo cura e onde tudo acontece. E quem não gosta de se perder aqui? De sentir, de provar, de viver a cidade? Ou aqueles banhos de imersão no filme Wanted. É disso que eu falo. Da capacidade de curar em horas aquilo que, fora daqui, demoraria dias ou meses. Esse é o efeito Coimbra. Presente nas tardes de sol, no espírito académico, nas festas e na noite, mas também nos amigos, nos momentos menos bons, nossos e deles, e nas noites frias e chuvosas. Tudo ajuda, tudo faz parte. As marcas que levamos daqui, duvido que algum dia deixem de se ver. Da mesma maneira que não me imagino a estudar noutra cidade, também não consigo encaixar a ideia de ter de sair daqui no final do curso. Mas vai acontecer. E nesse dia, como nunca, vamos perceber finalmente o poder do fado, sentir...

Baba & Camelo já à venda!

Está desvendado o segredo: é um menino! Baba & Camelo chega a este mundo para arrasar, prontinho a roer os chinelos lá de casa e morder aos estranhos! Um presente de aniversário perfeito para o avô! Uma verdadeira aliança para a namorada! Um souvenir marcante para o turista! Um carinho especial no dia da mãe! Esta é a tão aguardada salvação nacional que podem, a partir de hoje, adquirir para resolver os problemas da vossa vida: amarração, casamento, família, amor, negócios, vícios, doenças espirituais, inveja, mau-olhado ou impotência sexual. Podem obter o Baba & Camelo de duas maneiras: 1. através do site da editoraBubok  2. através da minha pessoa, com um preço de amigo. Basta comentar aqui no blogue, indicando um endereço de email (o comentário não será publicado) ou por mensagem no Facebook . Boas leituras de verão!