Sou espectador assíduo dos canais de documentários. Tento
perceber como funcionam as coisas, as vicissitudes de humanos e restantes
animais que povoam este planeta. Dou por mim a fazer exercícios simples e
esquemáticos para desmontar a teia complexa que constitui este mundo. Mas
depois há sempre coisas que não se conseguem entender. Como ontem, em Paris.
Fazendo o tal esquema até parece relativamente fácil: alguém
não gostou de um cartoon e vingou-se. Uma espécie de resposta. Funciona sempre
assim. Uma ação de um lado gera uma reação do outro. Uma das leis mais
elementares da física é seguida à risca. Mas, na verdade, não posso nem quero
acreditar que assim seja. Porque se o fizesse teria de entender que, 24 horas
depois, já sei quem vai ter o próximo passo.
Nada justifica o abate de uma pessoa. Quer esteja ela no
chão, sem defesa possível, quer seja ela o maior criminoso à face da Terra.
Este é o pensamento em que acredito e que gostaria – sonhava – ver expandido.
Como nos tais documentários, é hora de interromper os factos para desenhar mais
um esquema: cada ação destas, seja de um lado e do outro (porque as há dos dois
lados) afasta-nos do pensamento que acima descrevi.
Trabalho numa redação, o que, claro, não foi indiferente no
momento de reagir aos acontecimentos de Paris. A liberdade foi naturalmente
atingida e logo defendida por todos os setores. Creio, ainda assim, que não é o
ponto essencial. Não lhe retiro um cisco de importância, atenção, mas há algo
ainda mais fulcral que se tem vindo a destacar nos últimos 15 anos: o ódio.
Se há sentimento mais volátil é este. O ódio é tão belo que
tem seguidores, é tão perigoso que causa calafrios, é tão natural que sempre
existiu e assim vai continuar. Paris foi mais um degrau na escalada. E o maior
de todos os males foi o ricochete das balas disparadas que, depois de atingirem
os alvos, ressaltam em direções imprevisíveis.
Ao atingirem aquelas pessoas, os autores do ataque atiraram
também sobre as crenças ocidentais e, talvez sem o perceberem, sobre o próprio
Islão. As suas ações confundem os mais incautos, que misturam à primeira aquela
religião com terrorismo. O contrário também acontece: cada luta contra o que
chamamos de terrorismo, cada bomba largada nos países em tumulto no médio
oriente tem igualmente os seus ricochetes. E o efeito de confusão é também
sentido do outro lado.
Se nada mudar, as posições vão extremar-se cada vez mais e o
ódio vai espalhar-se pelos dois lados. Porque todos somos capazes de o sentir.
Basta a oportunidade certa.
Comentários