Só vai haver um campeão. Esta verdade de La Palice, que em
breve tanta alegria trará a muito boa gente, reduz no entanto o futebol à
crueldade que por vezes o caracteriza. Benfica e Sporting estão na luta por um
título que encaixaria que nem uma luva em qualquer um deles. Mas apenas um vai
celebrar. Com a justiça possível.
Em outubro escrevi no Record que o Sporting era o principal
candidato à conquista do campeonato, após ter ganho na Luz por 3-0. Comecei, no
entanto, por dizer que a corrida ao título é feita de momentos. Faltou-me, por
questões de espaço, referir que era muito cedo para fazer um julgamento final.
Passaram sete meses. Se tivesse de escrever hoje, obviamente
atribuiria o favoritismo ao Benfica – só depende de si – , embora mantivesse a
profunda frase dos momentos. É que faltam duas jornadas e parece, ainda assim,
que nunca faltou tanto como agora para sabermos quem leva o caneco.
O Benfica merece ser campeão. Se o conseguir vai coroar o
esforço de quem andou quase sempre atrás mas nunca deixou de acreditar que
terminaria na frente. O mérito será repartido: os jogadores contrariaram a tese
(factual) de que a promessa de um plantel semelhante ao de outros anos não foi
cumprida; Rui Vitória mostrou ser capaz de lidar com a mudança para um clube de
objetivos maiores, desprendendo-se do fantasma de Jesus que o assolou nos
primeiros tempos da época; e Vieira poderá incluir no seu livro de decisões
douradas o câmbio no comando técnico, de onde saiu um treinador carismático e
vencedor para dar lugar a uma aposta de risco.
As águias vão terminar com o melhor ataque da Liga. O
entendimento entre Jonas e Mitroglou não estava à vista de todos no início, mas
Vitória viu mais além e descortinou uma dupla temível. O Benfica chegou a
massacrar os adversários com golos, apesar de o famoso rolo compressor não
acompanhar, muitas vezes, o evoluir do marcador. Houve goleadas em que o Benfica
merecia vencer sim, mas por 1-0. No entanto, os golos apareciam, como diria
Ronaldo, qual ketchup.
E o Sporting? O Sporting merece ser campeão. Ninguém honesto
terá dúvidas disso e Jorge Jesus di-lo repetidamente neste final de temporada,
apesar de não escolher as palavras mais acertadas. É um facto que os leões
praticaram o melhor futebol no somatório final, à semelhança do que JJ havia
conseguido em grande parte dos seis anos na Luz.
A bola voltou a ser bem tratada no relvado de Alvalade, algo
que não acontecia há anos, e os reflexos foram imediatos. A paixão dos adeptos
rejuvenesceu, as bancadas voltaram a encher-se e o Sporting voltou a ser
candidato, tal como Jesus prometera na sua apresentação. Um futebol vistoso, de
ataque constante, sustentado em bons executantes e fruto de uma cirúrgica
política de contratações e evolução dos recursos já detidos fizeram com que o
Sporting ostentasse durante largas jornadas o primeiro lugar. O título seria um
prémio enorme para o trabalho da equipa e dava ainda mais ar ao peito feito –
com toda a legitimidade – dos adeptos leoninos.
Aconteça o que acontecer, já hoje em Alvalade ou amanhã no
Funchal, o campeonato saiu a ganhar com esta indecisão até ao final. A disputa
trará mais gritos de euforia e lágrimas de tristeza, que juntos formam a paixão
pelo futebol. E só ela é capaz de ofuscar tudo o que de menos bom aconteceu
fora das quatro linhas.
Desde já os meus parabéns ao futuro campeão nacional. A taça
ficará em boas mãos.
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